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1.
Bologna nos anos 1970 era Punk.
Punk em todos os sentidos, aliás. Um dos epicentros do movimento Punk/New Wave na Itália e, ao mesmo tempo, também naquela acepção que a classe média conformada usa para definir alguma situação difícil, perigosa, desafiadora.
La Rossa é o apelido de Bologna - tanto por seus onipresentes telhados medievais de telhas vermelhas, quanto por ser um bastião do Partido Comunista Italiano. Virou praça de guerra entre fascistas, comunistas e anarquistas. Um lugar onde a Guerra Fria esquentava e confrontos “por procuração" se davam nas ruas, entre pessoas físicas, longe do calculado jogo de forças militares de Otan e Pacto de Varsóvia.
Eram os Anos de Chumbo na Itália e lutavam, de um lado, as Brigate Rosse e movimentos estudantis e operários; do outro, os donos do poder oligárquico, escudados pela polícia truculenta e pela Propaganda Due, ou P2, loja maçônica conservadora e barra-pesada, que escondia em suas fileiras um grupo terrorista de extrema-direita. A treta era brava: a P2 foi responsável por uma bomba na estação de trem de Bologna, em 1980, que matou 85 pessoas e feriu centenas. Tinham as costas quentes, com gente endinheirada financiando o terrorismo de direita e militares de alto escalão protegendo e acobertando a P2. Por outro lado, as Brigate Rosse lutavam com o que tinham em mãos. Sequestraram Aldo Moro, ex-primeiro-ministro da Democracia Cristã, assassinado pelo grupo logo depois.
Ao mesmo tempo em que o bicho pegava, a luta política não existia no vácuo. Pelo contrário: cultura sempre foi inextricável da política (e vice-versa) e, na Itália setentista, as raízes daquilo que depois chamaram de Guerra Cultural tinham relação direta com os influentes escritos do filósofo comunista-raiz Antonio Gramsci.
Explicação rápida aqui: o teórico-prático Gramsci defendia que o processo revolucionário só poderia ser completo com a hegemonia cultural e política como alicerces gêmeos e interligados. Fez a cabeça de muita gente da esquerda e arrepiava os fascistas e conservadores em geral.
Não se espanta que Bologna fosse um epicentro da luta política: a cidade sempre teve uma cena cultural vibrante e era pólo de experimentações e vanguardas italianas. Cidade universitária, é apenas a sede da mais antiga universidade do Mundo Ocidental. Umberto Eco e outros grandes ensinaram durante anos no DAMS (Discipline delle Arti della Musica e dello Spettacolo), um curso da Universidade que era um dos mais vanguardistas do mundo e se tornou referência para as artes na Cidade Vermelha.
Um dos alunos do DAMS viraria um dos nomes mais revolucionários e alucinados da arte popular italiana dos anos 1970 e 1980, especialmente nos Fumetti, o termo italiano para Histórias em Quadrinhos : Andrea Pazienza.
2.
Pazienza não chegou a terminar o curso. Mergulhou no mundo dos quadrinhos, na arte de rua e no Movimento del ‘77 (Settantasette), um movimento político e cultural de contestação da política parlamentar engessada e conservadora da Itália. Nascido em protesto à reação conservadora que se seguiu ao Maio de 68 e à crise econômica que assolava a Itália e a Europa, o Settantasette buscava subverter e democratizar a cultura e, ao mesmo tempo, acelerar mudanças em todas as esferas públicas por meio da mobilização popular. Operários e estudantes se organizavam em grupos revolucionários autônomos e a arte era uma das pontas-de-lança desse movimento, que era claramente inspirado em Gramsci, no Situacionismo e no Punk. Foi nesse contexto que Pazienza publicou sua primeira HQ profissional, Le straordinarie avventure di Pentothal, em 1977.
Sem limites claros entre realidade, delírio e sonho, Pentothal funcionava como um alter ego do jovem Pazienza. Na história, Pentothal era a ‘identidade secreta’ onírica de Andrea, um estudante de Bologna imerso no caos dos protestos de rua e que sonhava com a revolução. Apresentava já as características da criação de Pazienza - um caos narrativo não-linear, uma arte intrincada e detalhista, entremeada por quadros que eram praticamente esboços. Era underground, político, sexual, Rock’n’Roll e anarquista - e tudo ao mesmo tempo.
O jovem Pazienza chamou a atenção de outros cartunistas com a mesma visão subversiva e passou a publicar na revista Cannibale, que durou pouco. Ao mesmo tempo, o Settantasette se esgotava, ao não conseguir fazer frente ao reacionarismo crescente da sociedade italiana na virada para os anos 1980.
Ninguém tinha tempo a perder e não lamentaram o fim da Cannibale. O mesmo grupo de cartunistas se juntou mais rápido do que os Ramones levariam para gritar 1, 2, 3, 4 e lançaram em Roma, em 1980, a revista mais famosa e revolucionária da época: a Frigidaire.
3.
Frigidaire era nome de geladeira. Minha mãe teve uma vermelha, que durou muitos anos e combinava com os azulejos de padrões geométricos coloridos bem típicos dos anos 1970. O mais inofensivo eletrodoméstico, símbolo da classe média conformada, batizava um dos experimentos mais radicais no mundo editorial, em toda a História. Numa época de extremos, Frigidaire era mais extrema do que qualquer das partes envolvidas na disputa ideológica. Nada era sagrado para a redação mais anárquica que existia no país mais anarquista (e um dos mais fascistas) do mundo. Colocavam-se à esquerda do Partido Comunista Italiano, que na época tentava se normalizar na política e compunha alianças com a Democracia Cristã; mas também enfiavam o dedo na cara da extrema-esquerda totalitária das Brigate Rosse (e era literalmente: os parças da Frigidaire sabiam quem eram os terroristas do grupo subversivo, já que frequentavam os mesmos bares e festas).
A Frigidaire, sob comando de Vicenzo Sparagna, o editor-chefe mais gente boa que você possa imaginar, trazia os (futuramente) grandes do quadrinho italiano, como Massimo Mattoli, Lorenzo Mattotti, Filippo Scozzari. Abria espaço para RanXerox, uma série alucinada de Stefano Tamburini e Tanino Liberatore - pensa só se hoje em dia haveria espaço para uma releitura de A Bela e a Fera, com uma menina de 14 anos que cria um robô que é meio um monstro de Frankenstein punk, sexualizado e anfetaminado, em histórias violentas, obscenas e ultrajantes. A revista ainda misturava na mesma edição matérias sobre física quântica e viagem no tempo, Teoria do Caos, matérias sobre Squats, colunas de opinião sobre Política Externa em tempos de Guerra Fria, resenhas de discos punk esporrentos, artigos de gente como Linton Kwesi Johnson e Antonio Negri, entrevistas com Ilona Staller (mais conhecida nos anos 1980 pelo nome artístico Cicciolina) e Norberto Bobbio. A primeira Frigidaire trazia a banda Devo na capa. Não por acaso, RanXerox parecia sair do universo robótico do Devo. Mais Punk, impossível.
Frigidaire transcendia os quadrinhos, apesar de ser esse o alicerce principal da revista. Nada ficava fora da mira dos anarquistas-situacionistas-punks dessa revista com nome de geladeira. E, inclusive, saíam dos limites das páginas da Frigidaire.
Em uma ocasião, aproveitaram que o tradicional jornal La Repubblica não era publicado às segundas feiras (algo que o Estadão também fazia até mais ou menos 1990) e imprimiram uma edição fac-símile, distribuída pela Itália como uma edição extraordinária, com uma manchete-bomba: queda do governo, dissolução do Estado Italiano e convocação de plebiscito para restabelecer a Monarquia. Muitos caíram no truque e, durante uma segunda feira inteira, os doidos da Frigidaire pautaram a mídia hereditária tradicional italiana.
Tempos depois, reproduziram capas de três jornais italianos com a bombástica notícia de que o popular ator Ugo Tognazzi, meio que um Tarcísio Meira/Walmor Chagas da comédia italiana, havia sido preso pela polícia como o líder oculto das Brigate Rosse. Mais comoção, choro e ranger de dentes.
Animados com o resultado dessas fake news prototípicas, repetiram o truque com o Krasnaya Zvezda (Estrela Vermelha), o jornal das Forças Armadas da URSS. Imprimiram uma edição fake, que foi distribuída em 1983 no Leste Europeu e no Afeganistão, com uma manchete que dizia “Chega de Guerra! Todos de volta para casa”. Causou tanta confusão entre os soldados que haviam sido abandonados num beco sem saída pelo governo soviético que os órgãos de imprensa do regime passaram meses tendo de desmentir a história - e com manchetes como “A Guerra deve continuar!”, o que só aumentava o ódio de quem não via sentido algum naquela aventura militarista fracassada que era a Guerra do Afeganistão (esse buraco negro geopolítico em que os EUA mergulharam de cabeça, anos depois).
Mas de volta ao que interessa: só mesmo a Frigidaire para bancar liberdade total para o enfant terrible dos quadrinhos italianos. É aqui que volta à cena o nosso Iggy Pop do nanquim, nosso Sid Vicious dei fumetti, nosso Lou Reed da arte sequencial - Andrea Pazienza.
Após os delírios de Pentothal, Pazienza estreava uma nova série: Zanardi, que iria muito além do que ele já havia feito até então.
(Disclaimer necessário: nunca li as Frigidaire na época, novinho que sou. Relato tudo aqui de segunda mão, revisionismo histórico mesmo. Mas tive algumas fontes boas. Um amigo mais velho teve algumas edições da Frigidaire, compradas em Milão nos anos 1980. Perdeu em alguma mudança. Outro italiano que conheci, fotógrafo que veio ao Rio cobrir o Rock in Rio de 1985 e nunca mais voltou para a Itália ao se perder numa carioquíssima nuvem de pó branco, contava várias histórias dessa época doida da Itália e que batem com o que pesquisei. A mais divertida foi uma em que, junto com um amigo, jogou um coquetel molotov no palco de um show do Santana no estádio San Siro, em Milão. “Mas ele mereceu, estava muito cuzão com aqueles solos chatos”, justificou. Milão ficou 17 anos sem receber shows em estádio depois dessa).
4.
Meu primeiro contato com os quadrinhos de Pazienza foi na antiga Animal, uma revista de grande formato e circulação irregular dos anos 1990. Era totalmente voltada para quadrinhos europeus de vanguarda, o que era raridade no mercado brasileiro. Seguia o template estabelecido pela Frigidaire anos antes. Radical, sem censura, sem compromisso e totalmente underground. Feio, forte e formal era a tagline da publicação. Naquele clichê batido dos nossos tempos, causaria escândalo ao ser publicada nesse Brasil de hoje, cada vez mais emocionado, carola e cafona.
Todos os autores da Animal pareciam incontroláveis. As pautas das matérias, idem, seguindo a inspiração italiana (teve uma edição que ensinava a fazer Crystal Meth em casa. Nunca tentei 😇).
A anarquia da Animal era praticamente inédita no Brasil desde os tempos do Pasquim, na Ditadura. Nessa época, final dos oitenta e começo dos noventa, apenas a Chiclete com Banana, de Laerte, Glauco e Angeli, era tão selvagem assim. Foi uma educação em quadrinhos europeus além dos mainstream de Tintin e Asterix ou os de ficção-científica cabeçuda, como Moebius e Enki Bilal.
Os quadrinhos de Pazienza são bem aquilo que pesquisas etnográficas falam a respeito do seu gosto musical: suas bandas preferidas sempre serão as que você gostava quando tinha 15 anos. Foi o autor que mais me chamou a atenção e tinha tudo a ver com o que eu ouvia na época.
Pazienza era Rock’n’Roll ao máximo. Jaqueta de couro sobre camiseta regata branca, meio como um Robert DeNiro em Caminhos Perigosos (1973), produzia alucinadamente e misturava momentos de puro talento em quadros complexos e cheios de detalhe com rascunhos claramente feitos às pressas. No lançamento do primeiro número da Frigidaire, no festival de quadrinhos de Lucca, Pazienza incorporou um Lou Reed picareta e fingiu injetar heroína durante a coletiva de imprensa. Mais Punk, impossível.
5.
Zanardi era mais radical e selvagem do que tudo o que Pazienza fez antes, tanto na forma quanto no conteúdo. Nenhum personagem de qualquer criador, por mais underground que fosse, descia tão baixo quanto Massimo Zanardi. Na primeira história, Giallo scolastico, de março de 1981, os personagens e premissas são apresentados. Massimo “Zanna” Zanardi é um órfão de pai e que conta com a ajuda financeira de um tio, estudante secundarista em uma escola de classe média alta de Bologna. Sempre com ele estão dois colegas de escola, o belo galã micheteiro Roberto “Colas” Colassanti e o filhinho de papai Sergio “Pietra” Petrilli. Estão lá como contraponto e complemento para Zanardi. Meio como um Sex & The City demente, machista, pornográfico e sem limites, diretamente das sarjetas de Bologna.
O nariz aquilino (uma napa de respeito) de Zanardi lembra uma ave de rapina - o que pode ser uma definição bem precisa para um personagem cruel, amoral e totalmente sem escrúpulos. Zanardi mente, chantageia, trai, rouba, comete violências sem sentido e brincadeiras estúpidas, assedia, violenta, se vinga por besteira, usa drogas como se nada fosse, faz todas as putarias possíveis. Tudo sem qualquer remorso ou culpa: Zanardi age como um pirata, um bárbaro, um saqueador da Idade Média. Há bem pouco de redentor na trajetória de Zanna, como se qualquer ato minimamente humano fosse estranho ao personagem. Mesmo assim, aqui e ali Pazienza deixa entrever que Zanardi é mais complexo do que parece. Ele e seus parças são, ao final, um espelho dos adolescentes e pós-adolescentes de uma Itália cada vez mais fútil, mercantilista e fascista - e que resultaria na ascensão de Berlusconi, na década seguinte.
Pazienza chega ao ápice da narrativa gráfica nessa série, que começou na Frigidaire e foi passando por outras revistas, como Comic Art e alter alter. Narrativa vibrante e oblíqua, com muita coisa que acontece no extracampo. Histórias que vão se revelando aos poucos, nenhuma separação entre sonho e realidade, diferentes técnicas narrativas - desde a HQ pura e simples, até histórias que se desenvolvem praticamente só em texto.
A quebra da quarta parede aparece algumas vezes. Numa delas, Colas pergunta numa banca se a Frigidaire nova já saiu; noutra, Pazienza se coloca na história, saindo no braço com Zanardi, ao tretarem no cinema, durante um filme. Pazienza não é páreo para Zanardi, que usa todo tipo de truque sujo na briga. Aqui, da mesma forma que Pentothal era um alter ego do jovem autor, Zanardi é talvez aquilo contra o que Pazienza luta. São as trevas que ele tenta combater. Uma luta em que, irremediavel e invariavelmente, ele acaba derrotado.
6.
Pazienza produzia muito. Fez poster para filme de Fellini, cenografia para teatro, ilustrações para revistas e campanhas publicitárias, exposições de arte, animações, capas de discos. Fez o álbum de quadrinhos Os últimos dias de Pompeo, em 1987, ao mesmo tempo em que estava em constante evolução com Zanardi. Suas últimas histórias de Zanardi mostram outra direção para a série: ao invés do realismo canalha e absurdo dos sujos boulevares de Bologna, Pazienza começa a usar Zanna, Colas e Pietra como ‘atores’. Uma história se passa no front soviético da II Guerra, Zanna como um sargento do exército fascista italiano. Em outro momento, Zanardi e amigos vão parar na Idade Média, numa aparentemente longa e planejada série de histórias. A série para por aí - as últimas páginas da edição encadernada com Tutto Zanardi são esboços e rascunhos de histórias não-publicadas, feitas só a lápis.
A última fase de Zanardi, com as histórias ambientadas na Idade Média, não especifica como os três parças foram parar lá. Com várias referências ao presente - um capacete medieval de um cavaleiro tem o escudo da Ferrari, um isqueiro Bic que Zanardi usa - abria um novo capítulo para Pazienza, com muito mais possibilidades narrativas. Com quadros totalmente pintados a pastel, parece ser a melhor arte de Pazienza. Uma ascensão do underground para uma arte mais madura, Pazienza pronto para ser um dos grandes autores dos quadrinhos europeus. Ao mesmo tempo, colaborava no roteiro do filme Il piccolo diavolo, de Roberto Begnini.
Em 16 de junho de 1988, Pazienza foi encontrado morto por sua mulher, Marina Comandini, no banheiro de sua casa. Tinha 32 anos.
Pazienza e Marina haviam se mudado para a pequena Montepulciano alguns anos antes, quando se casaram. Na história em que encontra sua criação, Zanardi, o Pazienza das HQs diz em um diálogo que havia vivido por 10 anos em Bologna, mas agora morava em uma pequena vila com ar puro e vinhos razoáveis. Na vida real, a mudança havia sido uma tentativa de ficar longe de uma luta em que as perspectivas eram sempre sombrias para ele: durante anos, foi viciado em heroína (nota curiosa: pouco antes de morrer, havia passado meses no Brasil, na tentativa de ficar longe da droga. Na volta à Itália retornou aos velhos hábitos).
Não surpreende que os autores mais identificados com o Punk na Frigidaire tiveram o mesmo fim: dois anos antes, Stefano Tamburini, um dos criadores de RankXerox, também havia morrido de overdose de heroína, como Pazienza. Tinha 30 anos. O bizarro clichê do Rock’n’Roll, live fast, die young, levou dois dos autores mais influentes e produtivos da geração de ‘77.
A história em que Zanardi enche o ficcional Pazienza de porrada talvez fosse premonitória. Esse lado escuro que Zanardi representava levava a melhor sobre o Pazienza em P&B, que aparece gato, imponente, com um colar com uma pequena granada, camiseta rasgada e jeans, mas termina vencido e alquebrado pela traiçoeira malícia de Zanardi.
Em uma das cenas da briga de rua, alguém fala para Colasanti: “Zanna está matando seu autor favorito!”. A resposta de Colas: “Não é meu autor favorito…não mais”, olhando para o Pazienza caído no chão, derrotado por Zanardi.
Epílogo.
Não sei onde foram parar as edições da Animal em que li Pazienza pela primeira vez. Durante anos, fiquei com essas histórias na cabeça. Há algum tempo, pude finalmente ler tudo: uma edição integral saiu na Itália há alguns anos, depois foi traduzida para inglês e francês e, desde o ano passado, para o português.
Um dos grandes escritores dos quadrinhos, sua obra já era impressionante e subversiva desde o começo. Hoje em dia talvez não tivesse espaço num mundo em que as histórias contadas devem sempre reforçar a superioridade moral de quem lê ou assiste, afagar e dar tapinhas nas costas dos emocionados leitores ou espectadores, congratulando-os por suas escolhas. Seriam impossíveis o grau de ambiguidade e as profundezas a que Pazienza descia.
Hoje, a Frigidaire ainda vive. Em uma região da Umbria existe a Frigolandia, uma comunidade em que Vicenzo Sparagna mantém viva a revista que já foi influente e hoje é uma relíquia de outros tempos. Publica edições de periodicidade inexata e mantém cursos e exposições.
Em Bologna, há uma escola de formação de artistas batizada com o nome de Andrea Pazienza. Há também uma praça arborizada que homenageia o artista.
Mesmo em um mundo diferente, talvez ainda perambulem pela noite de Bologna três figuras em busca de alguma balada inconsequente, um golpe traiçoeiro e uma ou outra sordidez. Podem ser um alto e bonito moreno musculoso, um baixinho inseguro e feioso e, finalmente, um loiro alto, magro, sempre com um sobretudo elegante, com um grande nariz e os olhos mais frios e insensíveis que se possa imaginar. Dispostos a qualquer coisa pela diversão.
E dispostos a qualquer diversão.